A farsa do politicamente correto: o poder de calar em nome da sensibilidade

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🏠Parnaíba (PI)

Walter Fontenele - Graduado em Ciências Sociais (Antropologia) pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI - 2021.

Mais do que proteger minorias, o politicamente correto se transformou em um instrumento de dominação simbólica, onde só alguns têm o direito de falar - e os demais devem apenas ouvir, calar e obedecer.

Nos últimos anos, o discurso politicamente correto deixou de ser uma simples pauta de boas maneiras sociais e assumiu o papel de um verdadeiro instrumento de poder. Longe de se tratar de uma proteção aos mais vulneráveis, essa nova "ortodoxia" passou a funcionar como um mecanismo seletivo de silenciamento: não se trata de “o que” se pode dizer, mas de “quem” está autorizado a dizer.

Esse jogo de forças encontra eco direto no conceito de dominação simbólica, desenvolvido pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. Para ele, os grupos dominantes exercem poder não apenas por meios econômicos ou políticos diretos, mas, sobretudo, por meio do controle dos códigos culturais, das linguagens e das categorias de pensamento. Em suas palavras:

A dominação simbólica é uma forma de imposição que se exerce não pela força física, mas pela capacidade de fazer com que a ordem social pareça natural.
(Bourdieu, Pierre. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.)

Sob essa lógica, apenas determinadas identidades ou grupos são reconhecidos como legítimos portadores da fala pública. Os demais, quando se manifestam fora da cartilha, mesmo que com argumentos racionais, são tachados de ofensivos, reacionários ou “sem lugar de fala”. A ofensa, portanto, deixou de ser um dado objetivo e passou a ser um privilégio de classe discursiva: um monopólio da condenação e da sensibilidade seletiva.

É nesse contexto que surge a cultura do cancelamento - um tipo moderno de excomunhão moral que pune, exclui e destrói reputações em nome de uma ética que pretende ser superior. No fundo, trata-se de uma reconfiguração da velha censura, agora travestida de virtude e acolhida por quem, paradoxalmente, se diz defensor da diversidade e da tolerância.

O problema não está em combater ofensas reais ou lutar por respeito. O problema é quando esse combate se transforma num novo tipo de opressão simbólica, onde apenas uma visão de mundo pode prevalecer - e qualquer discordância é tratada como heresia.

A crítica ao politicamente correto, portanto, não é um convite ao desrespeito, mas um chamado à lucidez. Porque quando o pensamento é policiado em nome da sensibilidade, o que se perde não é apenas a liberdade de expressão - é a própria possibilidade de um debate honesto sobre a realidade.

Por Walter Fontenele | Portalphb






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